Na quinta-feira (23), Águas Claras se tornou um símbolo de dor e indignação. O bairro, já marcado pelo medo constante, explodiu em um protesto onde os moradores, sem mais esperanças, tomaram as ruas, queimaram pneus e paralisaram o trânsito. O protesto, longe de ser um ato isolado, refletia o desespero de quem vive sob a ameaça constante da violência que parece não ter fim.
Sob o grito de “Basta de medo, queremos paz”, homens, mulheres e jovens se uniram em um ato que expôs as cicatrizes de uma região marcada pelo domínio do tráfico de drogas e pela insegurança. Cartazes improvisados e palavras de desespero tomaram as ruas. “A gente só quer viver sem medo, viver sem sofrer! Não é pedir muito!”, desabafou uma moradora emocionada, que preferiu manter o anonimato.
O protesto foi desencadeado pela crescente violência na área, com tiroteios quase diários e a presença cada vez mais forte do tráfico. Na quarta-feira que antecedeu a manifestação, o transporte público foi suspenso devido a ameaças de incêndio aos ônibus, gerando pânico entre os passageiros. A comunidade vivia em um estado de constante apreensão, e o protesto foi a forma que os moradores encontraram para denunciar sua realidade.
Durante o ato, a situação escalou. Manifestantes retiraram as chaves de dois ônibus, obrigando os rodoviários a interromperem o serviço. Com isso, a Secretaria de Mobilidade (Semob) precisou desviar os coletivos pela Avenida 29 de Março até que as vias fossem liberadas. um dos rodoviários que estava dirigindo um dos ônibus parados no local relatou a tensão vivida por ele e pelos passageiros. “A situação ficou insustentável, não sabemos o que fazer. O medo é constante. Eu só queria fazer meu trabalho, mas a cada dia temos que enfrentar uma realidade diferente”, disse ele, com a voz embargada. O clima de insegurança parecia tomar conta de todos, sem exceção.
Em outro vídeo de um morador de Cajazeiras, que registrou a cena, mostra passageiros do ônibus saindo e seguindo a pé para suas casas.
“Vivemos como reféns, sem poder sair de casa depois das 18h, sem saber se nossos filhos vão voltar da escola. Nem o ônibus, nosso direito de ir e vir, conseguimos mais!”, desabafou outro morador, enquanto ajudava a manter o fogo nos pneus que bloqueavam as ruas.
A Polícia Militar foi acionada e, após negociações, conseguiu dispersar os manifestantes e liberar as vias. Contudo, o recado estava dado. “A gente foi ouvido hoje, mas será que amanhã vão lembrar de nós? Será que vão agir antes que algo mais grave aconteça?”, questionou uma moradora, com os olhos cheios de lágrimas.
Este protesto, embora em Águas Claras, reflete a realidade de várias comunidades de Salvador, onde o medo se tornou parte do cotidiano e a ausência do poder público alimenta a expansão do crime organizado. Para os moradores, as promessas feitas por autoridades já não têm valor. Eles querem ação, querem segurança, querem a chance de viver sem medo.